Uma visão geral da célula

As células são as unidades básicas de estrutura e função dos seres vivos. Elas são os blocos de construção fundamentais de todos os organismos, desde as bactérias mais simples até as complexas plantas e animais. Cada célula é uma entidade independente, com a capacidade de realizar atividades metabólicas, crescer, se reproduzir e responder a estímulos ambientais.Existem diferentes tipos de células, cada um com suas próprias características e funções específicas. Os três principais grupos são as células animais, células vegetais e células bacterianas. As células animais são encontradas nos animais e também nos seres humanos. Elas possuem uma estrutura complexa, com uma membrana celular que envolve o citoplasma, onde estão localizados vários organelos, como o núcleo, as mitocôndrias, o retículo endoplasmático e o complexo de Golgi. Essas células são responsáveis por realizar diversas funções nos organismos animais, como a realização de processos metabólicos, a produção de energia, a comunicação entre células e a transmissão de impulsos nervosos. Por sua vez, as células vegetais são encontradas nas plantas e em alguns organismos fotossintetizantes. Elas têm uma estrutura única, com uma parede celular rígida e uma membrana celular envolvendo o citoplasma. Além disso, as células vegetais possuem organelos especiais, como os cloroplastos responsáveis pela fotossíntese, e as vacúolos, que armazenam água e nutrientes. Essas células são essenciais para a síntese de alimentos através da fotossíntese, o suporte estrutural das plantas e a realização de diversas outras funções vitais. As células bacterianas são os menores e mais simples tipos de células. Elas são encontradas nas bactérias, que são organismos unicelulares e pertencem ao reino Monera. As células bacterianas não possuem núcleo definido e seus componentes estão dispersos no citoplasma. Elas são muito diversas em termos de forma e estrutura, podendo ter diferentes formatos, como esférico, bastonete ou espiral. As células bacterianas desempenham papéis importantes na decomposição de matéria orgânica, na fixação de nitrogênio atmosférico e podem ser tanto benéficas quanto patogênicas para outros organismos.

A descoberta da célula

O holandês Anton van Leeuwenhoek (1632-1723 era um comerciante de tecidos que dedicava grande parte de seu tempo ao estudo da natureza. Ele possuía habilidades notáveis na polimento de lentes, tornando-as extremamente finas. Inicialmente, ele utilizava essas lentes para examinar as fibras dos tecidos e avaliar sua qualidade.

Com suas lentes e técnicas de iluminação, Leeuwenhoek conseguiu ampliar a imagem dos objetos em até 270 vezes. Isso permitiu que ele observasse microorganismos com apenas 0,003 mm de comprimento. Embora as imagens fossem distorcidas em forma e cor, esse avanço foi significativo, já que o olho humano não consegue enxergar objetos com menos de 0,1 mm de comprimento a olho nu.

Ao mesmo tempo em que Leeuwenhoek desenvolvia suas lentes e realizava suas observações em um mundo minúsculo que não podia ser visto a olho nu, o cientista inglês Robert Hooke (1635-1703) examinou pedaços de cortiça usando um microscópio composto, que consiste em duas ou mais lentes associadas dentro de um tubo de metal. Esse tipo de microscópio é semelhante aos microscópios utilizados atualmente (o microscópio de Leeuwenhoek tinha apenas uma lente). Hooke descreveu pequenas cavidades no interior desses pedaços de cortiça e as chamou de "células" (diminutivo latino de "cella", que significa "lugar fechado" ou "pequeno compartimento"). Na verdade, o que Hooke observou foram as paredes celulares e os espaços vazios deixados pelas células mortas da cortiça, que protegem o tronco das árvores.

Na década de 1820, o botânico escocês Robert Brown (1773-1858) descobriu uma pequena estrutura no interior de vários tipos de células e a denominou de núcleo. Em 1838, o botânico alemão Matthias Schleiden (1804-1881) concluiu que a célula era a unidade básica de todas as plantas. No ano seguinte, o zoólogo alemão Theodor Schwann (1810-1882) generalizou esse conceito para os animais. Assim, surgiu a teoria celular de Schwann e Schleiden: "Todos os seres vivos são compostos por células".

No entanto, ainda havia uma questão em aberto: de onde as células surgiam? Alguns acreditavam que elas poderiam se originar de líquidos presentes no corpo. Em 1858, o médico alemão Rudolf Virchow (1821-1902) afirmou que toda célula se origina de outra célula, ou seja, as células têm a capacidade de se reproduzir. Virchow fez outra afirmação ousada para a época: as doenças seriam consequência de problemas nas células.

Com esses avanços e descobertas, o estudo das células e do microscópio desempenharam um papel fundamental no desenvolvimento da biologia celular e contribuíram para nossa compreensão da vida em seu nível mais fundamental.

Teoria da célula

Com base nessas descobertas e em outras, foi elaborada a teoria celular, resultado de extensas pesquisas realizadas por diversos cientistas ao longo do tempo. Os princípios fundamentais da teoria celular são os seguintes:

O tamanho das células

No corpo de um ser humano adulto, existem aproximadamente 65 trilhões de células, uma quantidade impressionante. No entanto, essas células são tão minúsculas que não podem ser observadas a olho nu. Em sua maioria, possuem tamanhos que variam entre 10 µm e 100 µm, ou seja, entre 0,01 mm e 0,1 mm. Para se ter uma ideia, no final desta frase, seria possível alinhar cerca de dez células grandes (veja no quadro a seguir algumas unidades de medida utilizadas em Citologia).

Quando consideramos células animais típicas, seu diâmetro geralmente varia de 10 µm a 20 µm. Isso significa que elas são cerca de cinco vezes menores que a menor partícula visível a olho nu. Essa dimensão diminuta ressalta a importância do uso de técnicas e instrumentos como o microscópio para a observação e estudo detalhado das células.

É importante ressaltar que esses valores são apenas uma média, pois existem células com tamanhos maiores ou menores, dependendo do tipo celular e de sua função específica no organismo. Além disso, algumas células, como os óvulos humanos, podem ser visíveis a olho nu devido ao seu tamanho relativamente maior. No entanto, a grande maioria das células requer o uso de técnicas de ampliação, como o microscópio, para serem visualizadas e estudadas adequadamente.


Microscópios, corantes e fixadores

A capacidade de distinguir dois pontos a olho nu ocorre quando eles estão separados por uma distância igual ou superior a 0,1 mm. Caso a distância seja menor que 0,1 mm, apenas um ponto será percebido, resultando em uma imagem pouco nítida. Portanto, o olho humano possui um poder de resolução de aproximadamente 0,1 mm. Essa dimensão é semelhante ao diâmetro aproximado de um óvulo humano. Para visualizar estruturas menores, é necessário recorrer ao uso de microscópios.

O microscópio de luz ou óptico é composto por um sistema de lentes com um poder de resolução de 0,2 µm, superior ao do olho humano. Com esse instrumento, é possível ampliar a imagem de um objeto em cerca de 1.500 vezes, sem perda de nitidez. Esse aumento no tamanho da imagem é alcançado por meio de lentes convergentes, estudadas na área da Física. Utilizando esse tipo de microscópio, é possível observar células e algumas de suas estruturas internas. As fotografias obtidas por meio do microscópio são chamadas de micrografias. 

Para observar um objeto utilizando o microscópio, é necessário que ele seja atravessado por um feixe de luz, o que requer que o objeto seja suficientemente fino. Em observações menos detalhadas, um corte fino do objeto pode ser obtido utilizando uma lâmina de barbear. Já em observações mais cuidadosas, é necessário o uso de um aparelho especial chamado micrótomo. Nesse caso, o objeto, geralmente um tecido animal ou vegetal, é colocado em blocos de parafina para facilitar o corte, processo conhecido como inclusão.

No entanto, a maioria das estruturas celulares só pode ser visualizada no microscópio comum se as células forem tratadas previamente com corantes. Cada corante reage apenas com estruturas específicas da célula, proporcionando um contraste que facilita a observação. Para observar uma célula viva, são utilizados corantes vitais que não comprometem sua estrutura. Um exemplo disso é o verde-janus B, que é utilizado para evidenciar a mitocôndria, uma das estruturas celulares. Em observações prolongadas e repetidas, fixadores como álcool e formol são utilizados para preservar a célula, alterando sua estrutura mínimamente.

A Citologia deu um grande salto com a invenção do microscópio eletrônico de transmissão em 1939. Diferentemente do microscópio óptico, esse microscópio utiliza bobinas como eletroímãs no lugar de lentes de cristal. Essas bobinas desviam o feixe de elétrons, o que é estudado no campo da Eletromagnetismo, uma área da Física. A imagem obtida pode ser observada em uma tela fluorescente, semelhante a uma tela de televisão, ou em uma micrografia. Com essa técnica, é possível alcançar um poder de resolução de 0,0002 µm, cerca de um milhão de vezes maior do que o do olho humano. A utilização desse tipo de microscópio e outras técnicas sofisticadas possibilitam obter informações mais detalhadas sobre a estrutura, composição química e processos metabólicos das células. Posteriormente, foi desenvolvido o microscópio eletrônico de varredura, que permite uma visualização tridimensional do objeto. Nesse caso, um feixe de elétrons percorre a superfície do objeto, assim como uma pessoa explorando a textura de uma superfície com os dedos. A imagem gerada nesse tipo de microscópio é formada por elétrons refletidos, não pelos elétrons que atravessam o material.

Células procariontes e eucariontes

É possível observar que as células bacterianas são muito mais simples em comparação com as células animais e vegetais. De fato, as células bacterianas são mais simples do que as células dos outros organismos vivos. As células bacterianas são chamadas de células procarióticas (procariotas) porque o material genético (DNA) não é envolvido por uma membrana e não há um núcleo separado do citoplasma. O DNA está imerso em um gel aquoso contendo várias substâncias dissolvidas. No citoplasma das células bacterianas, encontramos ribossomos, que são responsáveis pela síntese de proteínas. Essa estrutura celular é envolvida pela membrana plasmática, composta por lipídios e proteínas. Além disso, há um reforço externo chamado parede celular, composto por cadeias de glicídios e aminoácidos.

Os organismos compostos por células procarióticas são denominados procariontes. Eles são geralmente organismos unicelulares com tamanho variando entre 1 µm e 10 µm e incluem as bactérias. Na classificação atual, também consideramos as cianobactérias, anteriormente conhecidas como algas cianofíceas ou azuis, como bactérias.

Por outro lado, as células eucarióticas (eucariotas) são maiores e mais complexas do que as células procarióticas. Seu material genético consiste em DNA associado a proteínas, formando os cromossomos, e está envolto por uma membrana chamada envelope nuclear ou carioteca, o que resulta em um núcleo individualizado. As células eucarióticas têm um tamanho que varia entre 10 µm e 100 µm. Organismos compostos por células eucarióticas podem ser unicelulares ou pluricelulares e são chamados de eucariontes.

Além dos ribossomos, o citoplasma das células eucarióticas contém uma variedade de organelas envoltas por membranas, que estão ausentes nas células procarióticas. Essas organelas incluem mitocôndrias, retículo endoplasmático, complexo de Golgi (atualmente chamado de complexo golgiense), cloroplastos, lisossomos, entre outros, que serão abordados nos próximos capítulos.

Surgimento de novas características na célula

A célula eucariótica, que é mais complexa que a célula procariótica, provavelmente surgiu a partir de dois processos principais: invaginações da membrana e a incorporação simbiótica de bactérias.

As invaginações da membrana são responsáveis pela formação de compartimentos celulares especializados. Dobras da membrana plasmática, formando canais e vesículas que deram origem a diversas estruturas celulares. Por exemplo, a invaginação da membrana levou à formação do envelope nuclear, uma membrana dupla que envolve o núcleo e separa o material genético do citoplasma. Além disso, as invaginações também originaram o retículo endoplasmático, uma rede de membranas que se estende pelo citoplasma e está envolvida na síntese e transporte de proteínas, assim como o complexo golgiense, que atua no processamento e transporte de moléculas.

Outro processo importante foi a incorporação simbiótica de bactérias por células primitivas. Acredita-se que, ao longo da evolução, bactérias aeróbicas tenham sido englobadas por células ancestrais, estabelecendo uma relação simbiótica vantajosa para ambas as partes. Essas bactérias intracelulares, que foram incorporadas e passaram a viver no interior das células, evoluíram para se tornar organelas específicas. A mitocôndria, por exemplo, teria surgido a partir dessa simbiose eucariótica-bacteriana, tornando-se responsável pela produção de energia celular por meio da respiração aeróbica. Da mesma forma, o cloroplasto, encontrado em células vegetais e algas, teria surgido a partir da incorporação simbiótica de uma cianobactéria fotossintetizante, sendo responsável pela realização da fotossíntese.

Esses processos de invaginação da membrana e incorporação simbiótica de bactérias levaram ao surgimento de uma célula eucariótica dividida em compartimentos, cada um desempenhando uma função específica. Essa divisão de trabalho dentro da célula permitiu que as diferentes funções fossem realizadas de maneira eficiente, o que possibilitou o aumento de tamanho das células e a evolução para organismos maiores e pluricelulares.