Respiração e fermetanção

A respiração e a fermentação são processos vitais que ocorrem em organismos vivos para obter energia a partir de compostos orgânicos. Embora compartilhem a mesma finalidade, esses processos diferem em relação aos mecanismos envolvidos e aos produtos finais gerados. A respiração é um processo metabólico complexo que ocorre nas células de organismos aeróbicos, como animais e plantas. Durante a respiração, as moléculas de glicose e outros compostos orgânicos são quebradas em presença de oxigênio, liberando energia armazenada na forma de ATP (trifosfato de adenosina). Esse processo ocorre em três etapas principais: glicólise, ciclo de Krebs e fosforilação oxidativa. A respiração aeróbica é altamente eficiente em termos de produção de energia, resultando em 38 moléculas de ATP por molécula de glicose. Por outro lado, a fermentação é um processo metabólico que ocorre em condições anaeróbicas, ou seja, na ausência de oxigênio. É uma via alternativa de produção de energia quando não há oxigênio suficiente para a respiração aeróbica. Durante a fermentação, a glicose é parcialmente oxidada, resultando na produção de produtos finais específicos, como ácido lático ou etanol, dependendo do tipo de fermentação. A fermentação é menos eficiente em termos de produção de energia, gerando apenas 2 moléculas de ATP por molécula de glicose. Além disso, a respiração é um processo mais complexo, que ocorre em várias organelas celulares, como as mitocôndrias, enquanto a fermentação ocorre principalmente no citoplasma. A respiração aeróbica é a forma mais comum de obtenção de energia em organismos multicelulares, proporcionando um fornecimento constante de ATP para as atividades celulares. A fermentação, por sua vez, é mais comum em organismos unicelulares, como bactérias e leveduras, ou em células de tecidos musculares em mamíferos durante atividades intensas em que o suprimento de oxigênio é limitado.

Respiração aeróbia

A respiração aeróbia tem início no citosol e, nos eucariontes, ocorre principalmente no interior da mitocôndria. Nos procariontes que realizam esse tipo de respiração, as etapas finais ocorrem na membrana plasmática. Por outro lado, a fermentação ocorre no citosol, tanto em procariontes quanto em eucariontes.

Uma das formas mais eficientes de obter energia das ligações químicas de uma substância é reagir suas moléculas com oxigênio. Isso acontece, por exemplo, na queima de gasolina e madeira. Nesse processo, chamado de combustão, as ligações são rompidas e os átomos de carbono e hidrogênio estabelecem novas ligações com o oxigênio, formando moléculas de dióxido de carbono e água, que contêm menos energia.

As reações de combustão, estudadas em detalhes na Química, desempenham um papel importante na geração de energia na indústria, em veículos com motores a explosão e no uso doméstico, como no caso do fogão a gás.

Embora a respiração aeróbia também produza dióxido de carbono e água, existem várias diferenças entre esses dois processos. Na combustão, a reação é violenta, com uma grande liberação de energia em um curto período de tempo. Na respiração, a quebra das cadeias de carbono ocorre gradualmente e a energia é liberada em pequenas quantidades. Caso contrário, o calor produzido destruiria a célula.

A liberação de energia na respiração ocorre em pequenas quantidades porque o processo é dividido em várias reações químicas intermediárias. A principal molécula utilizada pelas células como fonte de energia é a glicose. O processo de respiração celular aeróbia pode ser representado pela equação: C6H12O6 + 6O2 -> 6CO2 + 6H2O + energia

Essa equação resume o processo respiratório, mostrando as substâncias que reagem (glicose e oxigênio), as substâncias produzidas (dióxido de carbono e água) e a proporção relativa entre elas.

A energia obtida na respiração não é usada imediatamente. Cada parcela de energia é utilizada na síntese de uma molécula de adenosina trifosfato (ATP) a partir de uma molécula de adenosina difosfato (ADP) e um íon fosfato. Essa reação é chamada de fosforilação e resulta na formação de ATP com um fosfato rico em energia.

Quando uma célula precisa de energia para realizar um trabalho, a ligação entre o ADP e o fosfato é quebrada, liberando energia e o fosfato, agora com baixa energia (fosfato inorgânico). O ADP e o fosfato podem ser "recarregados" e formar ATP novamente.

A cadeia transportadora de elétrons consiste em uma série de complexos proteicos que transferem os elétrons dos hidrogênios (transportados pelo NADH e FADH2) de um complexo para outro. À medida que os elétrons são transferidos, ocorre liberação de energia, que é utilizada para bombear prótons (H+) da matriz mitocondrial para o espaço intermembranar. Esse processo cria um gradiente eletroquímico, com uma maior concentração de prótons no espaço intermembranar em relação à matriz mitocondrial.

A energia potencial do gradiente de prótons é então aproveitada pela ATP sintase, uma enzima presente na membrana interna da mitocôndria. A ATP sintase utiliza a passagem dos prótons através dela para catalisar a síntese de ATP a partir de ADP e fosfato inorgânico. Esse processo é conhecido como fosforilação oxidativa e é responsável pela maior parte da produção de ATP durante a respiração aeróbia.

Além da glicose, outros substratos, como ácidos graxos e aminoácidos, podem ser utilizados na respiração aeróbia para a obtenção de energia. Esses substratos passam por diferentes processos de degradação e atuam como fontes alternativas de elétrons para a cadeia transportadora.

É importante ressaltar que a respiração aeróbia é um processo altamente eficiente na produção de ATP, pois a oxidação completa da glicose resulta na produção de até 36 moléculas de ATP por molécula de glicose. Isso ocorre devido à maior quantidade de energia liberada durante a oxidação completa da glicose em comparação com a fermentação ou a respiração anaeróbia.

Em resumo, a respiração aeróbia é um processo vital que ocorre nas células eucarióticas para a produção de energia. Através de oxidações sucessivas, os hidrogênios presentes na glicose são transportados por coenzimas como o NADH e o FADH2 até a cadeia transportadora de elétrons. A energia liberada durante esse processo é utilizada para sintetizar ATP por meio da fosforilação oxidativa. A água é formada como produto final da reação, uma vez que o oxigênio é utilizado como aceptor final de elétrons. Esse processo é altamente eficiente na produção de energia, fornecendo a maior parte do ATP necessário para as atividades celulares

Etapas da respiração aeróbia

A respiração aeróbia pode ser dividida nas seguintes etapas: glicólise, ciclo de Krebs e cadeia respiratória

Glicólise

Esta etapa ocorre no citosol (hialoplasma) e consiste na quebra parcial da glicose em duas moléculas de ácido pirúvico. O ácido pirúvico, juntamente com outros ácidos formados durante a respiração, está presente em solução na forma ionizada, sendo chamado de piruvato. Em Química, a nomenclatura de um sal é derivada do nome do ácido, substituindo a terminação "ico" por "ato", "oso" por "ito" e "ídrico" por "eto". Portanto, o ácido pirúvico se torna piruvato.

Durante essa quebra parcial da glicose, que envolve vários compostos intermediários, uma parte da energia é liberada em quatro parcelas, permitindo a produção de quatro moléculas de ATP. Como foram utilizadas duas moléculas de ATP para ativar a glicose (energia de ativação necessária para iniciar a reação), o saldo final é de duas moléculas de ATP nesta etapa. Além disso, ocorre também uma desidrogenação, resultando na formação de duas moléculas de NADH.

A glicólise é um processo anaeróbio, o que significa que não requer a presença de oxigênio. É o primeiro estágio comum tanto na respiração aeróbia quanto na fermentação. Nas células aeróbias, o ácido pirúvico produzido na glicólise é transportado para as mitocôndrias, onde entra nas etapas seguintes da respiração aeróbia. Já nas células que realizam fermentação, o ácido pirúvico é convertido em outras substâncias, dependendo do tipo de fermentação.

Além da produção de ATP, a glicólise desempenha um papel importante na produção de precursores metabólicos, como o ácido pirúvico, que pode ser utilizado para a síntese de outros compostos, como aminoácidos e ácidos graxos. Portanto, a glicólise é um processo central no metabolismo celular, fornecendo energia e intermediários metabólicos para diversas vias bioquímicas.

Ciclo de Krebs

Estudado em 1938 pelo bioquímico alemão Hans Krebs (1900-1981), essa etapa ocorre na matriz da mitocôndria e no citosol das bactérias aeróbias. Antes do ciclo se iniciar, o ácido pirúvico passa por uma oxidação, na qual perde átomos de hidrogênio e elétrons (desidrogenação). Além disso, o ácido perde átomos de carbono e oxigênio, resultando na formação de uma molécula de NADH e uma de dióxido de carbono (CO2). Nesse processo, também é formado um composto intermediário de seis átomos de carbono, conhecido como ácido cítrico.

O ácido cítrico sofre desidrogenações adicionais e perde átomos de carbono e oxigênio, os quais são liberados como CO2. A partir dessas reações, são formados vários outros compostos intermediários que participam do ciclo de Krebs. Além de liberar energia gradualmente, o ciclo de Krebs permite que os compostos intermediários formados nesse processo atuem como ligações entre o metabolismo da glicose e outras substâncias provenientes dos alimentos, como lipídios e proteínas.

Por exemplo, os ácidos graxos presentes nos lipídios são decompostos em várias moléculas de acetil-CoA, que entram no ciclo de Krebs (enquanto o glicerol é convertido em um composto de três carbonos e entra na glicólise). Proteínas consumidas em excesso também podem ser utilizadas como fonte de energia: os aminoácidos perdem o grupo amino (NH2) e um hidrogênio, transformando-se em ácidos que entram em diferentes etapas do ciclo, dependendo do tipo de aminoácido.

Ao longo do ciclo de Krebs, ocorrem várias reações de oxidação e redução, resultando na produção de NADH e FADH2, que são transportadores de elétrons ricos em energia. Esses transportadores de elétrons são essenciais para a próxima etapa da respiração aeróbica, a cadeia respiratória, na qual ocorre a produção de ATP em grande quantidade. Portanto, o ciclo de Krebs desempenha um papel crucial na geração de energia a partir da glicose e de outras moléculas orgânicas durante a respiração aeróbica.

Cadeia respiratória

Nesta etapa, que ocorre na membrana interna da mitocôndria e na membrana plasmática das bactérias aeróbias, os átomos de hidrogênio retirados pelo NAD das cadeias de carbono durante a glicólise e o ciclo de Krebs são transportados por várias moléculas intermediárias até o oxigênio, resultando na formação de água e uma grande quantidade de moléculas de ATP.

Na realidade, não são transportados átomos de hidrogênio, mas sim seus elétrons, obtidos a partir da separação do átomo de hidrogênio em elétron e íon H+. Por isso, essa etapa também é conhecida como transporte eletrônico.

As moléculas transportadoras de elétrons estão organizadas na membrana interna da mitocôndria de acordo com a rota que os elétrons percorrem. Existem um conjunto de proteínas que recebem elétrons do NADH, um composto orgânico chamado ubiquinona ou coenzima Q, e várias proteínas contendo átomos de ferro ou cobre, conhecidas como citocromos (o termo "cromo" indica que essas substâncias são coloridas).

Durante o trajeto, os elétrons se combinam com os transportadores, formando compostos cuja quantidade de energia é menor que a do transportador anterior. Essa liberação de energia é utilizada na síntese de ATP, que ocorre em um complexo enzimático chamado ATP-sintase (anteriormente denominado ATP-sintetase).

O último transportador se oxida ao transferir os elétrons para o oxigênio, que é absorvido do ambiente. Nesse processo, o oxigênio é a molécula que é definitivamente reduzida, recebendo elétrons e íons H+ da solução e formando água. A cadeia respiratória também é conhecida como fosforilação oxidativa, pois a síntese de ATP depende da adição de um grupo fosfato ao ADP (fosforilação), e essa fosforilação ocorre com a energia proveniente das oxidações.

Nas células procarióticas, como as bactérias, a respiração aeróbica pode produzir até 38 moléculas de ATP por molécula de glicose, porém, o rendimento real da respiração é geralmente menor que esse valor teórico. Nas células eucarióticas, aproximadamente parte da energia liberada na cadeia respiratória é consumida no transporte das moléculas de ATP através da membrana mitocondrial, resultando em um saldo de aproximadamente 30 a 32 moléculas de ATP, dependendo do tipo de célula. No entanto, esses números podem variar de acordo com as condições metabólicas da célula, sendo, portanto, valores aproximados

Fermentação

Ao contrário da respiração aeróbia, na fermentação a glicose é quebrada sem a necessidade de consumo de oxigênio do ambiente. Para muitos organismos, esse processo é a única fonte de energia.

Esses organismos são chamados de anaeróbios estritos ou obrigatórios, pois não possuem as enzimas responsáveis pelas reações químicas do ciclo de Krebs e da cadeia respiratória. O oxigênio é tóxico para eles, portanto, só conseguem crescer e se reproduzir em ambientes desprovidos desse gás. Exemplos disso são as bactérias causadoras do tétano e do botulismo.

Outros organismos, como o levedo de cerveja, possuem as enzimas necessárias para a respiração aeróbia, mas podem realizar fermentação na ausência de oxigênio no ambiente. Esses são chamados de anaeróbios facultativos.

A maioria dos organismos realiza apenas respiração aeróbia e, portanto, morre quando falta oxigênio no ambiente. Esses seres são chamados de aeróbios estritos e são principalmente representados pelos eucariontes pluricelulares, que consomem mais energia do que os procariontes. Por exemplo, um ser humano não sobreviveria mais de 3 minutos se dependesse apenas da fermentação como fonte de energia.

Na fermentação, a quebra da glicose é concluída na glicólise. Na ausência de oxigênio ou quando não é possível utilizá-lo, outra molécula precisa receber os átomos de hidrogênio. Essa molécula pode ser o ácido pirúvico ou outro fragmento da glicose, que, ao receber os átomos de hidrogênio, forma um produto final, encerrando o processo.

O tipo de produto final formado na fermentação depende das enzimas específicas de cada célula. Assim, podem ser produzidos, por exemplo, álcool etílico, ácido acético, ácido láctico ou ácido butírico.

Como a glicose não é completamente quebrada e oxidada a gás carbônico e água, a fermentação não libera toda a energia contida em sua molécula, e os produtos finais ainda possuem energia armazenada. Portanto, o saldo energético da fermentação é de apenas duas moléculas de ATP (correspondentes à glicólise) para cada molécula de glicose.

Fermentação láctica

Iogurtes e coalhadas são produzidos a partir do leite e de uma mistura igual de microrganismos, conhecidos como lactobacilos, sendo os principais o Lactobacillus bulgaricus e o Streptococcus thermophilus. A fermentação da lactose presente no leite por essas bactérias resulta na produção de ácido láctico, daí o nome "fermentação láctica". Esse ácido coagula o leite, transformando-o em coalhada ou iogurte. Os hidrogênios retirados da glicose são recebidos pelo ácido pirúvico, resultando na produção do ácido láctico.

Os lactobacilos também são encontrados em nosso intestino, onde produzem diversas vitaminas essenciais para o organismo, como algumas do complexo B.

Em nosso organismo, as células musculares têm a capacidade de realizar tanto a respiração aeróbia quanto a fermentação láctica. A proporção entre esses dois processos depende da disponibilidade de oxigênio e da intensidade do exercício. Durante um esforço muscular rápido ou intenso, a quantidade de oxigênio que chega ao músculo pode não ser suficiente para suprir toda a energia necessária. Para compensar essa falta, as células musculares realizam a fermentação láctica. Posteriormente, parte do ácido láctico é transportada pelo sangue até o fígado, onde é convertido em ácido pirúvico, que pode ser oxidado ou convertido em glicose. Esse processo é conhecido como gliconeogênese. A respiração ofegante após o exercício ajuda a remover o ácido láctico e a reabastecer o ATP e o glicogênio.

Quando estamos em repouso, as células musculares armazenam uma certa quantidade de ATP. Parte desse ATP transfere sua energia para outra substância, chamada de creatina-fosfato (fosfocreatina), que é mais estável e pode ser armazenada por mais tempo na célula. Quando necessário, a fosfocreatina libera energia para a produção de ATP, que é utilizado no trabalho muscular. Em invertebrados, os músculos armazenam arginina-fosfato, uma substância com a mesma função da fosfocreatina. Ambas as substâncias são chamadas de fosfágenos devido à sua capacidade de doar e receber fosfato

Fermentação alcoóica

A produção de bebidas alcoólicas, como o vinho e a cerveja, tem uma longa história registrada em inscrições em placas de pedra com nove mil anos, encontradas na Mesopotâmia. Essa arte milenar é resultado da fermentação realizada por um fungo unicelular conhecido como levedo de cerveja ou fermento, cientificamente chamado Saccharomyces cerevisiae.

Na fermentação alcoólica, o ácido pirúvico passa por uma descarboxilação antes de receber os hidrogênios do NADH. Isso resulta na produção de dióxido de carbono e álcool etílico. O dióxido de carbono pode ser mantido na bebida, como ocorre no champanhe e na cerveja.

No entanto, como o levedo de cerveja é um organismo anaeróbio facultativo, a presença de oxigênio afeta sua atividade durante a fermentação. Se houver uma quantidade significativa de oxigênio, o levedo de cerveja não produzirá álcool, mas sim dióxido de carbono e água. Esse efeito é conhecido como efeito Pasteur, em homenagem ao cientista francês Louis Pasteur (1822-1895), que estudou a fermentação, entre muitas outras contribuições para a ciência.

Além das bebidas alcoólicas, a fermentação também é utilizada na produção do álcool utilizado como combustível nos veículos. No Brasil, por exemplo, o álcool é produzido a partir da fermentação do açúcar extraído da cana-de-açúcar.

Respiração anaeróbia

Na fermentação, um composto orgânico derivado da glicose é utilizado como aceptor final de hidrogênio, não ocorrendo o ciclo de Krebs nem a cadeia respiratória. Já na respiração anaeróbia, ocorre o ciclo de Krebs e a cadeia respiratória, mas o oxigênio não atua como aceptor final dos hidrogênios provenientes da glicose. Em vez disso, esses hidrogênios são transferidos para compostos inorgânicos presentes no ambiente, como nitratos, sulfatos ou carbonatos.

A respiração anaeróbia é realizada por certas bactérias que habitam solos profundos, com baixa disponibilidade de oxigênio, e resulta na produção de uma quantidade menor de ATP em comparação com a respiração aeróbia. O termo "respiração" é utilizado em ambos os processos devido às semelhanças e à presença das três etapas que caracterizam o fenômeno da respiração.